segunda-feira, 26 de novembro de 2012

O desabafo de um professor



QUESTIONÁRIO PARA OS PROFESSORES
Prezado (a) professor (a).
Este departamento solicita de V.S.ª a gentileza de responder as questões abaixo:
1 - Qual a disciplina que leciona, para quantas turmas, e escolas?
Ensino língua portuguesa no Ensino Fundamental para três turmas, sendo uma de 8º ano e duas de 9º ano; redação no Ensino Médio para cinco turmas de 1º ano; e, ainda no Ensino Médio, literatura para seis turmas de 3º ano.
2 – Quais são os maiores desafios que você encontra como docente dessa disciplina?
São muitos desafios enormes, mas poderia destacar como o pior deles o desestímulo dos alunos. A maioria deles não consegue enxergar motivos para estarem num banco de escola. A única coisa na qual pensam é em conseguir nota para passar de ano. O conhecimento não os motiva.
3 – No seu cotidiano de sala de aula que procedimentos didático-pedagógicos você mais utiliza?
É nessa hora que aparece um dos motivos para que os alunos não se sintam estimulados de acordo com alguns pedagogos, pensadores, teóricos, etc. Não creio que a didática que utilizo seja a melhor possível. Não passo horas a fio tentando descobrir o que fazer para que minhas aulas sejam atrativas. Até porque acredito que o querer conhecer é que deveria ser o estímulo, mas infelizmente está longe de o ser, pois o que costumo chamar de “artimanhas” do Sistema conseguem desviar a atenção dos alunos (e não só de alunos) tão bem, que o papo de que estudar é preciso para ser alguém na vida já não cola mais há um bom tempo. Afinal de contas, um diploma deixou de ser sinônimo de conhecimento há muito. Mas, tentando responder, digo que não faço mais que seguir o currículo, do jeito que dá, pois nem sempre o tempo deixa. Evito ao máximo o ensino de regras e conceitos gramaticais (já que ninguém, a não ser os professores de língua portuguesa, nos melhores casos, os conhecem mesmo) e, com o apoio do livro didático, tento discutir os tipos textuais. A única coisa que consegui de diferente e, às vezes, acredito que inovadora, foi fazer de minhas aulas uma gincana onde tudo vale pontos. Em algumas salas tem dado certo (no fundamental, é claro), mas existem alunos que não aceitam nada. Uma coisa é certa: depois das gincanas alguns alunos, que antes nada queriam, melhoraram um pouco. Também foi muito bom conseguir que eles passassem a se comportar melhor, já que bagunça faz o grupo perder ponto. Cabe lembrar ainda que ao menos uma vez por bimestre assistimos a algum filme que ajude na compreensão dos temas que são discutidos para posterior produção textual. Um livro por bimestre também faz parte das atividades. A maioria lê, os outros começam. Já é alguma coisa... Ao fim da leitura eles vão à frente e contam a história que leram. De vez em quando surgem algumas ideias que tento colocar em prática. Às vezes dão certo, outras não. Estou tentando...
4 – Que estratégias você utiliza para enfrentar as deficiências e defasagens apresentadas pelos seus alunos?
Professores milagrosos conseguem resolver esses problemas. Creio que no ensino público poucos casos de recuperação existem. A verdade na qual creio é que os alunos de escola pública com esses problemas são empurrados pelas “barrigas” dos professores até o dia em que se tornam miseráveis, ou até o dia em que acordam e correm atrás do que não deram valor. Então se tornam professores... Ironias do destino... O professor não tem como fazer um trabalho verdadeiro, pois falta tempo, organização, recursos, apoio. Falta quase tudo o que visualizamos quando estamos planejando nossas atividades ou discutindo o ensino lá dos bancos das universidades, ou ainda lendo um desses teóricos que utopicamente acreditam que todo mundo é Cristo. O sistema educacional público, claramente, nunca foi e nem é capaz de proporcionar uma educação de qualidade. Isso nunca foi prioridade do Sistema, e nem será tão cedo. Sabemos que o que eles querem são números. Números para encherem as fábricas e cofres daqueles que fazem aumentar o seu poder. Daí a aprovação de quem nada sabe... daí o professor não ser valorizado... daí um povo que mantém no poder aqueles que o oprimem... Essa é a minha realidade. O que faço diante disso? Tento convencê-los a ler... Entende?
5 – No processo de avaliação do aluno que instrumentos você utiliza?
1-      Envolvimento;
2-      Leitura e contação das histórias que nos romances, novelas, teatros eles leem durante o bimestre;
3-      Prova com interpretação textual, às vezes, questões gramaticais, às vezes, e sempre com produção textual.
Obs: como realizamos durante todo o bimestre uma gincana, as atividades avaliativas acima acabam se tornando parte dela. No final das contas a pontuação fica dividida da seguinte forma: 3 pontos para o grupo vencedor da gincana (são cinco grupos e a cada posição abaixo da primeira perde-se 0,5 ponto, ficando o grupo último colocado com apenas 1,0 ponto dos 3,0), 2,0 pontos para a leitura e contação da história lida, 4,0 pontos para a prova (com produção textual) e 1,0 ponto para o manifesto (no último bimestre as turmas de 9º ano devem organizar um manifesto; no ano passado foi chamando os pais e responsáveis a participarem mais da vida escolar de seus filhos, neste ano será convidando às pessoas a descobrirem o mundo da leitura).
6 – Você tem problemas de relacionamento com seus alunos e demais colegas da Escola? Justifique sua resposta.
Por mais pessimista e péssimo que eu pareça ser, ainda sou um dos melhores professores de minha escola (me perdoem a pouca modéstia) de acordo com muitos dos que trabalham ou trabalharam comigo. Meu pessimismo muitas vezes é por conta de um dos motivos que me faria ter problemas com alguns professores e é o que me faz ter problemas com muitos alunos. É que não consigo dar pontos. E sobre isso já ouvi barbaridades na sala dos professores, já comprovei em diversos conselhos de classe e também na sala de aula, quando vejo que os alunos que foram aprovados são semianalfabetos. Isso me deixa, às vezes, muito irritado... Pô, se os professores facilitam tanto, como que os alunos irão encarar seriamente a coisa? Por isso muitos alunos me detestam. E olha que eu facilito, pois o Sistema me obriga.
7 – Que concepção do aluno, escola e sociedade subsidiam sua prática pedagógica?
Aluno: aquele que, em sua maioria, vem à escola em busca de notas para passar de ano e não de conhecimento;
Escola pública: instituição governamental que forma escravos do sistema; da escola privada é melhor eu nem falar...
Sociedade: alienados. Infelizmente...
Precisamos mudar isso. É o que eu tento fazer em minha escola, mesmo sabendo que não vou conseguir. Só espero não desistir, como a maioria dos professores que conheço: – Não tem jeito não, rapaz. Passe esses moleques. Se não o ruim será você.
É isso que escuto sempre e, às vezes, até reproduzo. Infelizmente...
8 – Que outras observações você gostaria de acrescentar?
Muita coisa já foi dita. Já dá pra refletir bastante... Educar sempre foi e continua sendo muito difícil, mas não podemos desistir. Até porque acredito que se existe alguém que pode de alguma forma interferir no futuro da sociedade, esse alguém é o professor. Mas infelizmente muitos professores não fazem isso da forma que acredito ser a correta... Nem sei se existe uma forma correta... Mas vamos à luta!

Eis o desabafo...

terça-feira, 6 de novembro de 2012


Refletir sobre isso é cansativo... machuca...
Será que um dia nos cansaremos da injustiça?

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Crônicas

Na escola


Eita, que dava gosto de ver a professora M... em sua sala de aula. Que desempenho... ela naquele blazer, impecável... tudo perfeito. Alunos bem vestidos, sala de aula super limpa, dez alunos apenas, bastante material. Livros, mas muitos livros mesmo, revistas, e imagine só: cada aluno tinha em sua mesinha um notebook, tudo era ali registrado, e nem se levantar para mostrar a tarefa ao professor o aluno precisava, pois, da sua mesa a professora M... acompanhava todo o processo, e qualquer coisinha, já poderia interferir ajudando os alunos.
            A escola era pública. Acredite! E que beleza... salas espaçosas, climatizadas, um pátio amplo, refeitório com mesas e cadeiras, onde os alunos sentiam prazer em merendar. E a merenda, essa era muito boa... um cardápio que era pura saúde. Muitas frutas e verduras. Alguns alunos, quando chegavam à escola com dez ou onze anos de idade, pois a escola era apenas de Ensino Fundamental Maior, não gostavam muito de tantas frutas, verduras, legumes, mas com o tempo, e em curto tempo, passavam a adorar. A escola exalava um aroma de vida, saúde, comprometimento com a educação, amor, verdade... e naquele dia a professora M... iria ser condecorada com uma certa premiação pelo seu bom desempenho na escola. Como disse, era ela impecável, de uma responsabilidade incontestável. A professora ideal.
            Todos, alunos e professores, após terminar a aula, como de costume, ficavam no jardim conversando sobre os acontecimentos do dia, discutindo assuntos da aula acabada a pouco, e nesse dia, então, tinham mais um motivo. E chegada a hora, o diretor da escola saindo ao pátio e subindo no coreto do jardim da escola chamou a atenção de todos. Quanta ordem... os alunos tão educados... todos ouvindo o diretor falar, e tão bem, da amada professora, e ela ao lado, orgulhosa. Foi quando um pássaro que voava pelo jardim da escola atacou a professora e, fantasticamente, vomitou na professora que acordou.
            Era um copo d’água. A professora havia desmaiado após uma telha daquele velho telhado ter caído em sua cabeça, sem esquecer que era dia de segunda, pela manhã, e ela ainda não havia curado sua ressaca. Uns alunos preocupados, outros fazendo piadinhas, outros muito ocupados em suas conversas (alguns no celular), outros aproveitando o acontecido fugiram da aula para o vídeo game... são muitos, mais de cinqüenta. A professora já acordada começou a se lembrar do sonho, olhou seus alunos... uma bagunça terrível... olhou as paredes, tudo tão sujo... cadê o material? Os livros? Seus alunos nem livros didáticos tinham... “notebook?!” pensou ela com cara de riso. Foi se levantando devagar, saindo da sala, e viu o jardim, de cimento grosso, ou melhor, cimento grosso esburacado. Nada de verde... me engano! Tinha um tonzinho de verde na madeira que cercava a escola. Imagine! Nem muro tinha... Correu um ventinho, enfumaçado, mas refrescou um pouquinho. Era mês de outubro, e além da fumaça das queimadas e carvoeiras, o calor era enorme, e ela se lembrou da sala climatizada...
            Bem, não tinha sido grave. A telha pegou de raspão na cabeça. No fundo ela achou foi bom. Saiu um pouco daquele mundo tão ruim e real. Pensou nos impostos que tanto ela quanto os pais de seus alunos pagam: “daria pra ser como no sonho...”. Tomou uma água. A coordenadora já estava agoniada, querendo liberar os alunos. Quem os agüenta? Ela disse que não. Voltou pra sala, fitou o mais novo buraco do telhado, e: “Silêncio meninos! Parem já com essa bagunça! Que falta de educação é essa! Chega! Já copiaram essa parte do quadro?” 

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O Analfabeto Político


O Analfabeto Político
Bertold Brecht (1898 - 1956)
O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos
acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que
se orgulha e estufa o peito dizendo que
odeia a política.
Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política,
nasce a prostituta, o menor abandonado,
o assaltante e o pior de todos os bandidos,
que é o político vigarista, pilantra,
o corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.